"Parto no Cortiço", de Ricardo Lobo. Xilogravura (40cm x 30cm). Premiada no Salão do Centro Cultural Brasil/EUA, Santos. 1992 |
Assim como a renúncia e a sucessão de seu governo, Luiz Henrique da Silveira tratou a concessão do abono de R$ 2 mil reais para oficiais da pior forma possível. Está sendo um parto complicado demais: negociações cheias de idas e vindas, muitos mistérios e quase nenhuma informação concreta. Boatos também não faltaram.
Ainda em dezembro do ano passado, a Secretaria da Fazenda arquivou processo da Secretaria de Segurança Pública que pedia a concessão do abono. O motivo? Falta de recursos em caixa. Não seria dessa vez que o governo iria parir a criança.
Numa conta simples, o abono para 1.140 oficias da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros, da ativa e da reserva, representaria um acréscimo de R$ 2.280.000,00.
A esperança do oficialato estava com o próprio governador, que prometera, no final do ano passado, reajuste para março desse ano.
O sexo da criança
Do ano passado até hoje, nos corredores do Centro Administrativo, da Assembleia Legislativa e dos quartéis circularam muitas versões dos valores de abonos: R$ 2 mil para os oficiais e R$ 500 para os praças; R$ 2 mil para coronéis e diminuindo o valor até R$ 250 para soldados; e, a última, R$ 2 mil para oficias, divididos em oito vezes, e R$ 250 para praças, em uma única etapa.
Para os praças, os comandantes, naquele tom paternal, argumentavam que eles iriam levar vantagem com essa fórmula, pois a quantia a ser recebida vai ser paga à vista, em apenas uma parcela, enquanto a bolada dos oficias vai ser dividida em oito vezes (!).
Houve ainda boatos de que o abono seria pago somente em outubro de 2010 ou julho de 2011.
Desgosto
Da forma que for paga e a quantidade que chegar vai representar um "cala boca" para a categoria, que almeja paridade com os delegados da Polícia Civil.
Isso quer dizer que, mesmo recebendo o dinheiro, o oficialato ainda vai ficar em desgosto. É um dos poucos casos que uma categoria fica triste com aumento salarial. O estrago moral e o abatimento político já está feito.
A explicação é a seguinte: a Polícia Militar (leia-se, os oficiais) está se sentindo uma instituição de segunda categoria, pois recebeu tratamento de terceira. (É como aquela moça solteira, abandonada pelo namorado, que dá a luz à uma criança no corredor de um hospital público sucateado.) Enquanto a Polícia Civil (leia-se, os delegados) receberam o abono ainda em novembro passado.
Não quero
A repulsa é tão grande que um coronel da reserva chegou a remeter carta ao governador abrindo mão do abono. Escreveu o coronel Carlos Hugo Stockler de Souza:
(...)
Assim procedo in memoriam à estirpe, dos inesquecíveis empedernidos e altivos camaradas da antiga Força Pública. Oficiais como um Lopes Veira que ante a negação de um pedido de calçados para a tropa deixou recado ao governador que desfilaria com ele a testa da tropa descalços pelo centro da Capital.
(...)
Macular todo este histórico quebrando a altivez de uma classe com miseras prestações é nos relegar a condição de MERCENÁRIOS de uma sociedade.
(...)
Sua maestria maquiavélica priorizando a Policia Civil concedendo-lhe de imediato o merecido abono em detrimento á nossa PM bem mais antiga, tem sentido justificável no conceito da atual desprestigiada e chã política.
(...)
No clã civil moram votos que não se calam não forem suas reivindicações atendidas. Já na PM a mordaça da hierarquia lhe garante a imunidade de quaisquer manifestações contrarias.
Comando
Em março, os coronéis Celso Dorian de Oliveira, chefe do Estado-maior, e Marlon Teza, presidente da Acors, circularam pelos corredores da Assembleia Legislativa para buscar apoio. Ambos, além dos coronéis Luiz da Silva Maciel (subcomandante) e Fernando Rodrigues de Menezes (ajudante-geral), estão muito interessados em ver os abonos em vigor. Primeiro porque contribui financeiramente com a vida do oficialato e de suas próprias, e, segundo, porque querem ser o "pai da criança" e se cacifarem para assumir o comando-geral da PM. O atual titular do cargo não se apresentou.
Seja como for, venha como vier, na quinta-feira (25), essa criança, vítima de um parto retardado, pode até ganhar um pai biológico, mas vai viver como uma enjeitada - e sofrer muita rejeição.