Li na "Folha de São Paulo" e trouxe para cá:
LEIO NO UOL que Dentinho, do Corinthians, é um dos atacantes cogitados pelo Lyon, campeão francês, para ocupar a vaga que deve ser deixada por Fred.
Os outros são o palmeirense Kleber, o cruzeirense Guilherme e o coxa-branca Keirrison.
Se Dentinho deixar o Corinthians, haverá vários motivos para lamentar. Primeiro, porque se desfaria assim uma dupla singularmente simpática e potencialmente poderosa: Dentinho e Dentão, que é como o cartunista Ziraldo rebatizou Ronaldo, transformado por ele em personagem de desenho.
Os dois são carismáticos, risonhos, dentuços. Uma amiga querida brincou: o dente está para o futebol como a língua presa para o automobilismo? Boa pergunta. Mercados garantidos para fonoaudiólogos e ortodontistas.
Mas a possível saída de Dentinho seria lamentável também por outros motivos. Poucos viveram com tanta intensidade e em tão pouco tempo a agonia e o êxtase de ser corintiano.
Aos 19 anos, com apenas duas temporadas no profissionalismo, ele vivenciou a alegria de ser craque revelação do Paulistão, a depressão do rebaixamento à Série B e a redenção do retorno triunfal à elite. Foi aplaudido, vaiado, carregado em triunfo.
Um verdadeiro curso de madureza.
Mas Dentinho, como muita gente sabe, tem outra peculiaridade. Assim como o ex-craque italiano Roberto Baggio, ele é budista. Curioso esse paralelo: se o sereno budismo de Baggio surpreendia por caracterizar alguém inserido numa cultura altamente ruidosa e passional, o que dizer do budismo de um garoto pobre da periferia paulistana, corintiano desde o berço?
Só o fato de ter passado ao largo do catolicismo, da umbanda e dos mil tentáculos evangélicos que dominam o ambiente futebolístico já faria de Dentinho um caso à parte.
Mas o mais interessante, a meu ver, é que o seu budismo é um budismo à brasileira, ou melhor, um budismo corintiano, "maloqueiro e sofredor" como convém.
Uma das imagens mais belas e inusitadas do ano futebolístico que passou foi protagonizada por Dentinho e o goleiro Felipe, ao final da partida em que o Corinthians venceu o Ceará, no Pacaembu, selando sua volta à Série A. Invertendo o que normalmente acontece, os dois saltaram o alambrado para cair no meio da massa alvinegra em festa.
Um evento inesquecível.
No momento em que todos os holofotes estão voltados para o Dentão que aliás salvou nesta virada de ano a mídia esportiva da falta de assunto, acho que vale a pena pensar um pouco na trajetória do Dentinho, que o técnico Paulo César Carpegianni tentou sem êxito chamar de Bruno Bonfim.
O noticiário sobre Ronaldo é feito quase só de números: os milhões de reais de salário, as quotas da publicidade, os quilos a mais, o percentual de gordura, as semanas de treino.
Mas na figura de Dentinho, no seu percurso meio desengonçado pelo campo e pela vida, há algo que não se pode medir ou quantificar. Nem definir. Seja no "terrão" da zona leste, no Pacaembu ou nos gramados franceses, é um menino do Brasil, correndo em busca do seu satori (o estado zen-budista de iluminação). E isso é bonito de ver.
José Geraldo Couto - 10/01/2009